*Este conteúdo foi produzido pela HSM, veiculado no dossiê: A era exponencial, na edição nº120 jan/fev de 2017 na Revista HSM Management.

PARA APROVEITAR A ERA DA ABUNDÂNCIA, O GESTOR DEVE MUDAR SUA MENTALIDADE, O QUE REQUER UM CONJUNTO DE FERRAMENTAS PSICOLÓGICAS.

Por Peter Diamandis e Steven Kotler

Tecnologias exponenciais acrescentam alavancagem física a todo empreendedor. Mas, para ele se tornar um empreendedor exponencial de fato – ou seja, para ser uma força pró-disrupção –, necessita de ferramentas psicológicas que lhe forneçam uma vantagem mental.

Subir o Monte da Ousadia,além de desafiador tecnologicamente, é de uma dificuldade psicológica incrível. Todo inovador que conhecemos enfatiza a importância do jogo mental para o sucesso – especialmente os empreendedores exponenciais Elon Musk, Larry Page, Jeff Bezos e Richard Branson, que vemos como modelo.

A atitude é o segredo e, para quem quer tê-la, sugerimos as ferramentas e técnicas mentais da metodologia conhecida como Skunk.

Em 1943, o engenheiro-chefe da fabricante de aeronaves Lockheed, Kelly Johnson, recebeu uma ligação do Departamento de Defesa norte-americano. Caças alemães tinham acabado de surgir sobre a Europa, e os EUA precisavam de um modelo para o contragolpe. A missão era essencial e o prazo, impossivelmente apertado.

Kelly, então, teve uma ideia. Nas instalações da Lockheed em Burbank, Califórnia, recrutou um pequeno grupo de seus engenheiros e mecânicos mais brilhantes, deu-lhe total liberdade de projeto – nenhuma ideia seria considerada excêntrica ou estranha demais – e isolou-o do resto da burocracia da Lockheed; poucos sabiam que a unidade existia. A unidade foi apelidada de Skunk Works em homenagem a quadrinhos da época.

O sucesso foi total: o primeiro jato militar norte-americano foi entregue ao Pentágono 143 dias depois, sete dias antes do prazo – em um projeto militar típico, esse é o tempo que leva para assinar a papelada. Nas décadas seguintes, a Lockheed repetiu o sucesso, produzindo alguns dos aviões mais famosos do mundo – o U-2, o SR-71, o Nighthawk, o Raptor – com a mesma metodologia. Qual a explicação?

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METAS OUSADAS E SUBMETAS

A natureza difícil das metas da Lockheed constitui o primeiro segredo do sucesso da metodologia Skunk. Os psicólogos Gary Latham e Edwin Locke descobriram que fixar metas é uma das formas mais fáceis de aumentar a motivação e o desempenho em 11% a 25% e que grandes metas levam aos melhores resultados, superando de
longe metas pequenas, médias e vagas.

O Google é uma empresa que trabalha com metas elevadas, que habitam aquela área indefinida entre os projetos audaciosos e a pura ficção científica. Em vez de ganhos de meros 10%, buscam melhorias de 10x (dez vezes) – o que é um aumento de 1.000% no desempenho.

Essa é uma informação crucial para o empreendedor exponencial. Iniciar qualquer negócio é difícil e, quando há a intenção de abalar o setor, aterrorizante. Só que essa ambição é a alavanca-chave.

A META AMBICIOSA É UMA ALAVANCA OCULTA E DEVE SER UTILIZADA, AINDA QUE ATERRORIZE.

Locke e Latham descobriram também que há um requisito para que a meta ambiciosa funcione: o alinhamento dos valores da pessoa com o que ela está fazendo (no caso de Kelly e sua equipe, o objetivo era salvar o mundo do
perigo nazista).

Outro achado importante diz respeito à necessidade de decompor a visão em partes executáveis, pequenas, que os psicólogos chamam de submetas. Elas trazem dois benefícios.

O primeiro é o alinhamento do risco com a recompensa. Poucos projetos chegam a receber todo o financiamento de que precisam no início. Geralmente, o capital chega em estágios à medida que os empreendedores acham novos meios de atenuar o risco.

O segundo benefício das submetas é psicológico. Latham e Locke ensinaram que existe uma alavancagem oculta em fixar grandes metas, mas estas só fazem aumentar a motivação. É igualmente fundamental que a pessoa que fixa essas metas confie em sua capacidade de alcançá-las, e isso pressupõe decompor grandes metas em submetas alcançáveis.

ISOLAMENTO

Outra chave da metodologia Skunk diz respeito ao isolamento do projeto. Isolar-se estimula o risco, encoraja ideias estranhas e ousadas e age como uma contraforça à inércia do resto da sociedade. Como Burt Rutan, vencedor do
X Ansari Prize, certa vez ensinou: “Na véspera de uma coisa ser realmente revolucionária, ela é uma ideia louca”.

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ITERAÇÃO RÁPIDA

O terceiro grande segredo da metodologia Skunk é fazer iteração o mais rápido possível – essa é uma das melhores estratégias de atenuação do risco já desenvolvidas. Ou como no lema não oficial do Vale do Silício: “Fracasse cedo, fracasse com frequência, fracasse avançando”.

Empreendimentos ousados requerem esse tipo de abordagem de experimentos. Como a maioria deles falha, o progresso real requer testar toneladas de ideias, reduzindo o intervalo entre os testes e aumentando os conhecimentos obtidos com os resultados. Isso é iteração rápida.

CRIAR UMA EMPRESA COM AUTONOMIA, MAESTRIA E PROPÓSITO COMO VALORES É CRIÁ-LA PARA A VELOCIDADE.

 

 

AUTONOMIA, MAESTRIA E PROPÓSITO

A metodologia Skunk inclui também um tipo especial de motivação. Aqui vale mergulhar um pouco na ciência da motivação. Na maior parte do século passado, essa ciência concentrou-se nas recompensas extrínsecas – ou seja, motivadores externos, do tipo “faça isso para obter aquilo”.

Um grupo crescente de pesquisas tem mostrado, no entanto, que as recompensas extrínsecas não funcionam como se supõe. Para funções bem básicas, o dinheiro pode efetivamente influenciar o comportamento. Mas, quando as necessidades básicas deixam de ser uma causa constante de preocupação, as recompensas extrínsecas perdem a eficácia.

As recompensas intrínsecas – significando satisfações internas, emocionais – tornam-se mais cruciais, três em particular: autonomia, maestria e propósito. Autonomia é o desejo de conduzir nosso próprio barco. Maestria é o desejo de conduzi-lo bem. E propósito é a necessidade de que a jornada signifique algo.

Para sermos ousados, precisamos dessas recompensas intrínsecas. Se os empreendedores não atualizam sua psicologia para acompanhar a tecnologia exponencial de que dispõem, poucas chances eles têm de vencer essa corrida.

Isolar a equipe de inovação cria um ambiente onde as pessoas são livres para seguir a própria curiosidade, ampliando a autonomia. Iteração rápida significa acelerar os ciclos de aprendizado, ou seja, pôr as pessoas na rota da maestria. E alinhar grandes metas com valores individuais cria o verdadeiro propósito.

Mais importante, você não precisa estar dirigindo uma Skunk Works para tirar proveito desses motivadores intrínsecos. O Google explora a “autonomia” por toda a empresa com seus 20% de tempo livre concedidos aos colaboradores.

Tony Hsieh, CEO da Zappos, enfatiza a maestria, tornando a “busca de crescimento e aprendizado” central a sua filosofia corporativa e dizendo a famosa frase: “O fracasso não é um distintivo de vergonha. É um rito de passagem”.
E o CEO da Toms Shoes, Blake Mycoskie, explora o poder do propósito ao decidir doar um par de sapatos a uma criança no mundo em desenvolvimento para cada par vendido.

Com esse tipo de núcleo psicológico, não surpreende que Google, Zappos e Toms tenham se tornado líderes setoriais em tempo recorde. Criar uma empresa com autonomia, maestria e propósito como valores-chave significa criar uma empresa construída para a velocidade. E isso é fundamental a um empreendedor exponencial.

FLUXO

Todas essas ferramentas mentais de que a metodologia Skunk trata servem a uma função adicional. Não apenas aumentam a motivação e desempenho, mas também desencadeiam o estado de consciência conhecido como fluxo.

PENSAR EM LARGA ESCALA

Elon Musk, Larry Page, Jeff Bezos e Richard Branson exemplificam o empreendedor exponencial, comprometido com o ousado, com o duradouro e com o magistralmente executado. O que todos têm em comum também é a capacidade de pensar em larga escala. A tecnologia exponencial permite aumentarmos a escala como nunca, mas, sem pensar grande, isso não ocorrerá.

Os seres humanos não captam a grande escala. Nosso cérebro evoluiu para processar um mundo mais simples, onde tudo o que encontrávamos era local e linear. Descobrimos que, para pensar em grande escala, todos os quatro contaram fortemente com as ferramentas psicológicas da metodologia Skunk, mais a supercredibilidade [veja quadro à esquerda] e as seguintes estratégias mentais adicionais:

1. Entusiasmo [veja no infográfico abaixo].
2. Pensamento de longo prazo.
3. Pensamento centrado no cliente.
4. Pensamento probabilístico.
5. Pensamento racionalmente otimista.
6. Confiança em princípios básicos, também
conhecidos como verdades fundamentais.

 

Tecnicamente, o fluxo é definido como um estado ótimo de consciência no qual sentimos o melhor de nós e atingimos nosso melhor desempenho. E você provavelmente teve alguma experiência nesse estado. Se alguma vez perdeu uma tarde em uma ótima conversa ou se envolveu tanto em um projeto de trabalho que esqueceu todo o resto, viveu isso. O fluxo descreve aqueles momentos de absorção total, em que ficamos tão concentrados na tarefa à frente que todo o resto desaparece. Ação e consciência se fundem. O tempo voa. O eu desaparece.

O empreendedor precisa, portanto, aprender a usar os desencadeadores de fluxo, sejam psicológicos (individuais), sejam sociais (para grupos). Os psicológicos são as estratégias para cada um de nós voltarmos a atenção ao agora. O pesquisador pioneiro do fluxo Mihaly Csikszentmihalyi identificou entre essas estratégias as metas claras, o feedback imediato e uma relação saudável entre desafio e habilidades. Se o desafio é grande demais, o medo nos toma. Se é fácil demais, não prestamos atenção a ele. O fluxo surge no meio, entre o tédio e a ansiedade.

Os desencadeadores sociais se referem ao fluxo coletivo, que acontece com um grupo de pessoas. Se você já assistiu a uma virada no último quarto de um jogo de basquete, sabe do que estamos falando. Como precipitar o fluxo coletivo?

Três dos desencadeadores sociais são versões coletivas dos desencadeadores psicológicos identificados por Csikszentmihalyi: concentração séria da equipe, metas claras compartilhadas e boa comunicação (ou seja, montes de
feedback imediato). Porém há mais sete desencadeadores sociais: participação igual de todos, um elemento de risco (mental ou físico), familiaridade (o grupo se comunica com compreensões implícitas), fusão de egos (humildade), sensação de controle (escolher os próprios desafios e ter as habilidades necessárias para superá-los), escuta atenta e, por fim, o hábito de sempre dizer “sim, e…” (para que as interações sejam aditivas, mais do que argumentativas).

Há, ainda, os desencadeadores criativos do fluxo. Pesquisas mostram que novos ambientes e experiências diferentes costumam ser o trampolim para novas ideias e, se a criatividade for considerada virtude na cultura de uma organização, isso também contará pontos a favor do fluxo.

SOPA DE PEDRA E ENTUSIASMO

Ouvi a história da sopa de pedra na faculdade e ela nunca me deixou. Fazer sopa de pedra é a única forma de um empreendedor vencer. As pedras são as ideias ousadas; as batatas e cenouras doadas, os recursos e o apoio de investidores e parceiros.

O que atrai as doações para a sopa de pedra ser produzida é o entusiasmo do cozinheiro. Só que não o entusiasmo cego, nocivo, e sim o entusiasmo explorador, de quem avança e pensa. Por isso, além das ferramentas psicológicas da metodologia Skunk, da construção de supercredibilidade e do pensamento em larga escala, recomendamos a você só mais uma coisa: entusiasmo empreendedor.

Complemente seu conhecimento com alguns livros que também falam sobre o assunto neste post.